O primeiro domingo de Maio assinala, em Portugal, o Dia da Mãe. Por este motivo, decidi que era a altura perfeita para vos falar de uma obra que integra a colecção da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
Ao contrário do que tem acontecido até aqui em artigos temáticos, esta não é uma obra de um artista português, embora nos mantenhamos no panorama museológico nacional. Este quadro mostra aquilo que é ser mãe, ou aquilo que deveria significar ser mãe – falo-vos de Cuidados Maternais, de Mary Cassatt.

Mary Cassatt, Cuidados Maternais, pastel, c. 1891. Fundação Calouste Gulbenkian. Fonte: FCG.
Mary Cassatt (Pensilvânia, 1844 – Chateau de Beaufresne, 1926) começou a sua carreira por seguir o estilo tradicional académico, algo que fez por mais de uma década. No entanto, algumas rejeições para expor no Salon de Paris fizeram com que se juntasse aos Impressionistas, tornando-se a mulher mais reconhecida do movimento. Manteve-se neste grupo também por cerca de dez anos e depois avançou para um estilo próprio e que viria a definir a sua obra.
Os seus trabalhos mais conhecidos são aqueles que mostram a relação entre familiares e, sobretudo, entre mães e filhos. A primeira obra que terá pintado representando este tema foi Gardner Held by His Mother, datada de 1888, ainda numa técnica Impressionista. É, então, a partir de 1900 que se vai dedicar quase exclusivamente a esta temática, representando sobretudo cenas intimistas do quotidiano doméstico burguês do final do século XX. Este tipo de obras culmina em cerca de um terço da sua produção total.
Nesta altura, atraída pela luminosidade e simplicidade do Japonismo, usava cores leves e em tons pastel aplicados em blocos cor, evitando o preto, tida como uma cor proibida para os Impressionistas. Algo que também se nota nestas obras é um aparente aumento de sentimentalismo, talvez relacionado com a morte prematura da irmã e do irmão, em 1882 e 1906, respectivamente.
Tendo decidido desde cedo que uma vida como mulher casada seria incompatível com a carreira que sonhava para si, Cassatt não casou nem teve filhos. Porém, isto não a impediu de criar estes retratos que mostram de forma tão cuidada e ternurenta a relação entre mães e filhos, especialmente em idade infantil.

Mary Cassatt, Cuidados Maternais (detalhe), pastel, c. 1891. Fundação Calouste Gulbenkian. Fonte: FCG.
A obra que vos mostro hoje foi adquirida por Calouste Gulbenkian em Março de 1919, aquando a venda da colecção Manzi. Isto faz com que a compra se tenha dado ainda em vida da pintora e torna-a a única pintora representada na chamada Colecção do Fundador.
Em Cuidados Maternais vemos a tal fuga ao preto, com todos os elementos mais escuros preenchidos a castanho, e o uso abusado do branco, também muito característico dos Impressionistas. Uma obra cheia de luz que nos leva a pensar tratar-se de uma cena matinal, acompanhando a altura em que a mulher prepara a criança para o dia.
Outro facto curioso desta obra é o facto de os elementos carnais, ou seja relativos ao corpo humano, estarem concluídos com grande detalhe, enquanto que as roupas, a cadeira e o fundo se apresentam quase só em mancha. Mais um elemento que remete para o Impressionismo e que se prende com a vontade que estes artistas tinham de reter e eternizar a espontaneidade do momento. Este detalhe permite-nos focar toda a nossa atenção na cena de maternidade que se desenrola à nossa frente.

Mary Cassatt, Cuidados Maternais (detalhe), pastel, c. 1891. Fundação Calouste Gulbenkian. Fonte: FCG.

Mary Cassatt, Cuidados Maternais (detalhe), pastel, c. 1891. Fundação Calouste Gulbenkian. Fonte: FCG.
Quanto ao retrato em si, vemos, como já referido, uma mulher que veste uma criança, sendo que neste momento específico lhe calça a meia do pé esquerdo. A mulher, com a criança ao colo, está concentrada no que faz, com a cabeça voltada para baixo. A criança de bochechas rosadas tem o braço esquerdo esticado para o lado como quem pede alguma coisa ou chama por alguém, com o olhar voltado também nessa direcção.
É uma cena que transmite calma, não só pela luminosidade das cores utilizadas, mas também porque ambas as figuras se apresentam serenas, quando, sabemos bem, o momento de vestir uma criança pode, muitas vezes, tornar-se um desafio. A suavidade dada à pele ajuda também a esse sentimento de calma.
Este momento em específico aparece ainda registado em dois desenhos, embora numa perspectiva ligeiramente diferente. Um deles pertence ao Museum of Art da Rhode Island School of Design (e que podem ver abaixo) e o outro integra uma colecção privada. Ambos datam de cerca de 1890 e, portanto, serão estudos preparatórios para esta obra em pastel.

Mary Cassatt, Mother Pulling on Baby’s Stocking, grafite sobre papel, c. 1890, Museum of Art-Rhode Island School of Design. Fonte: RISD.
Segundo o dicionário, Mãe é a mulher que deu à luz ou a mulher que dispensa cuidados maternais. Há já alguns anos que se vem cimentando a discussão de que mãe é quem cria e não necessariamente quem dá à luz, embora, na maior parte dos casos, ambas coincidam. Cuidados Maternais não diz qual a relação biológica entre as duas figuras, mas mostra-nos que ser mãe é dar este conforto na hora de vestir, é abraçar um filho quando ele precisa, é dar esta luz à vida de alguém.
o que mais se destacou para mim foram os detalhes das caras, pormenores muito interesssntes em obras que parecem bastante “simples”
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É verdade, as caras retêm todos os detalhes, mas o amor está no gesto representado.
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No planeta coabitamos roboticamente passamos longe com nossas vibes
Deste toque terapêutico de nossas mães
Como terapeuta holistica reconheço muito teu trabalho tão sintonizado
Com nossas mazelas mundiais
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