Ainda no âmbito das celebrações dos 60 anos do Tribunal da Relação do Porto/Palácio da Justiça, inaugurou, no passado dia 27 de Maio, a exposição Nadir Afonso – Os Portugueses, com curadoria de José Rosinhas Art Gallery Wall. Aqui, é possível ver várias serigrafias e ainda quatro tapeçarias realizadas pela Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, peças que, na sua maioria, remetem para as vistas de cidades, tema muito característico da obra do pintor flaviense.

Nadir Afonso nasceu em Chaves a 4 de Dezembro de 1920. Desde sempre direccionado para a Pintura, aos 4 anos pinta um círculo a vermelho e bem delineado numa parede de casa e aos 14 anos realizou as suas primeiras pinturas a óleo. Mesmo tendo seguido formação em Arquitectura na Escola Superior de Belas-Artes do Porto, por conselho de um funcionário do estabelecimento, nunca parou de pintar, seguindo essa formação, em 1946, na École de Beaux-Arts de Paris. Apesar de abandonar definitivamente a Arquitectura em 1965, Nadir Afonso ainda teve a oportunidade de se relacionar e trabalhar com alguns dos grandes nomes da área, como Le Corbusier (1887-1965) e Oscar Niemyer (1907-2012).
É em 1954, ao regressar a Paris, que desenvolve estudos na Pintura com uma série a que vai dar o nome de Espacillimité, muito importante na sua obra. Estes trabalhos desenvolvem-se a partir da relação que tem com os artistas orientados na procura de uma arte cinética. Para além dessa área, a sua produção artística deambulou pelas mais diversas correntes, como o Surrealismo, o Realismo Geométrico e até o Egípcio.
A sua obra está espalhada um pouco por todo o país e durante a sua vida participou em inúmeras exposições, nacional e internacionalmente, sendo aclamado com vários prémios, como o Prémio Amadeo de Souza-Cardoso, em 1969. Faleceu em Cascais a 11 de Dezembro de 2013.


Nadir Afonso, Pontes sobre o Reno, serigrafia sobre papel.
Nadir Afonso entregou-se em absoluto à Arte e à estética num modo de quase obsessão. Foi um artista teórico que defendia o rigor e a exactidão das coisas, ao mesmo tempo que nos encoraja a procurar o lado mais simples de tudo. E aqui encaixa o uso da Geometria, algo que marca esta exposição dedicada às várias cidades, nacionais e internacionais, pelas quais passou ao longo da sua vida. A sensibilidade humana ajuda-nos a entender estas leis geométricas, algo que conseguimos a partir de formas presentes na Natureza.
Para além de pintar as suas obras, também tratou de as teorizar, tendo várias publicações de sua autoria e todos os seus catálogos de exposição continham textos escritos por ele especificamente para a ocasião. O que lhe interessava sobretudo nestes textos era falar sobre o seu processos criativo, mais do que falar do resultado final de cada obra.

Esquerda: Nadir Afonso, Fuga da Europa, serigrafia sobre papel.
Direita: Nadir Afonso, Tatuados, serigrafia sobre papel.

Esquerda: Nadir Afonso, Apolo, serigrafia sobre papel.
Direita: Nadir Afonso, Esfinge, serigrafia sobre papel.
Diz-nos o Dr. Nuno Ataíde das Neves, Presidente do Tribunal da Relação do Porto: Nesta exposição, as suas cidades, de todo o Mundo, que visitou e respirou, que apreendeu, tornando-as suas, corroboram linhas, cores e traços que recriam o espaço e instante de percepção do artista, transmitindo-nos a sensação de movimento, quase como se sentíssemos e ouvíssemos o ambiente retratado.
Entre as várias peças em mostra, esta exposição leva-nos pela multiplicidade da obra do artista, num mundo que em muito nos recorda Fernando Pessoa e os seus heterónimos. Nestas cidades e campos reconhecemos os vários elementos arquitectónicos característicos de cada local, bem como os elementos naturais como o céu e a água do oceano, por exemplo.
Apesar destes elementos serem representados de forma geométrica, é notória a sensibilização para a criação de proporções adequadas, sendo que os pontos principais se destacam dos secundários. Este jogo de perspectiva acontece, desde logo, com a passagem de elementos tridimensionais para uma superfície dimensional como é a tela ou uma folha de papel. Nadir Afonso dá destaque a algo maior a partir da utilização de elementos mínimos, como as linhas (rectas ou curvilíneas), a mancha e a cor.
Voltar à origem da simetria, não é regressar ao sentido fundador dos primeiros actos, como entende Husserl, mas voltar, antes, aos actos fundadores dos primeiros sentidos.

Nadir Afonso, Évora, serigrafia sobre papel.

Nadir Afonso e Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, Évora, tapeçaria.
Desde os Jardins da Pensilvânia, a Sevilha, passando por Copacabana e ainda por Évora, são muitos os locais que podemos visitar através destas obras, com elementos facilmente identificáveis de cada um e com uma paleta cromática que também se relaciona com a identidade de cada sítio retratado.
A figuração é algo que aparece com pouca frequências nestas obras expostas e quando acontece, essas personagens ganham o papel principal da composição. Nestes casos, há deambular entre temas e imagens mais clássicas e outros mais recentes, entre Apolo e a Fuga da Europa, bem como Tatuados e Bordel, respectivamente. Ainda assim, as linhas e as manchas coloridas continuam a ser a expressão escolhida e utilizada para Nadir Afonso.
As cores de todas as obras são de uma vivacidade inacreditável, mesmo quando em tons mais aguados, algo a que o pintor nos habitou com as suas obras. Apesar da escolha da Geometria para representação dos elementos, a paleta cromática segue a representação fiel do que vemos representado, algo que podemos constatar, como já referido, pelos elementos naturais, como a relva e o céu, por exemplo.
Seja pelas linhas ou pelas cores, esta exposição, que representa cerca de 40 anos de produção de Nadir Afonso, leva-nos quase por um momento de desfolhar de um álbum de viagens do artista. Cada obra consegue imergir-nos e transportar-nos para o local representado e é fácil sair de uma para fazer o check-in imediato na seguinte. Numa altura em que o que mais há são restrições para nos deslocarmos, não há melhor forma de viajar.


Nadir Afonso, Cidade dos Príncipes (detalhe), serigrafia sobre papel.
A exposição Nadir Afonso – Os Portugueses pode ser visitada até ao dia 25 de Junho, no 5º piso do Tribunal da Relação do Porto/Palácio da Justiça. Disponível de Segunda a Sexta-feira, das 9h às 17h, com entrada é gratuita.
Imagem de topo: Nadir Afonso, Jardins da Pensilvânia (detalhe), serigrafia sobre papel.
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