Hoje não só é o Dia Mundial da Fotografia como é também o trigésimo ano em que esta data é celebrada.
Mas sabem o porquê da escolha do dia 19 de Agosto para comemorar a arte fotográfica? Não? Este artigo serve exactamente para responder a essa questão, levando-nos numa viagem até ao início oficial da Fotografia.

Louis Daguerre, Daguerreótipo de Interior, 1837. Fonte: Britannica.
A ideia de criar o Dia Mundial da Fotografia partiu do fotógrafo indiano O. P. Sharma (n. 1937). Graças a ele, a American Society of Media Photographers e a The Royal Photography Society juntaram-se para oficializar o dia. Com esta declaração, estas associações fizeram com que a ideia se expandisse rapidamente e que fosse adoptada por todo o mundo. O Dia Mundial da Fotografia é muitas vezes celebrado com concursos, cursos e exposições fotográficas, cativando desde os mais profissionais aos mais amadores.
Mas porquê o dia 19 de Agosto?
19 de Agosto foi o dia escolhido, pois marca o aparecimento do Daguerreótipo, cujo uso se popularizou levando à criação das primeiras fotografias permanentes da História.

Daguerreótipo. Fonte: EPICS.
O Daguerreótipo, uma câmara fotográfica que tornou o processo de gravar imagens finalmente acessível, foi criado por Louis Jacques Mandé Daguerre (1787-1851), conhecido físico, pintor, cenógrafo e, claro está, inventor. Mas a sua história vai além disso.
Esta câmara foi desenvolvida nos anos 30 do século XIX e, embora o seu nome esteja apenas relacionado com Daguerre, reflecte o trabalho de dois homens. Joseph Nicéphore Niépce (1765-1833) era o outro parceiro e aquele de quem partiu o formato principal da invenção. Nicéphore Niépce é responsável pela que é considerada a primeira fotografia, Vista da Janela em Le Gras. A mesma data de 1826, altura em que criou uma máquina na qual uniu elementos químicos e físicos à qual aliando assim o princípio da camara obscura – algo que já era utilizado desde a Grécia Antiga, mas à qual só os artistas, como Leonardo da Vinci (1452-1519), tinham acesso – à característica fotossensível dos sais de prata.
Niépce junta-se a Daguerre em 1829, sabendo que as suas limitações não o fariam chegar mais longe. Juntos procuraram novos materiais e experimentaram a placa de cobre revestida a prata que expuseram a cristais de iodo, logo no início da década de 1830. Esta seria a base do Daguerreótipo. Niépce viria a falecer no início de 1833, mas Daguerre continua o processo.
Esquerda: Daguerreótipo de Daguerre. Fonte: OGlobo.
Direita: Joseph Nicéphore Niépce. Fonte: PhotoAlbumUniversal.

Vista da Janela em Le Gras, Joseph Niépce, 1826. Fonte: DW.
A invenção fica concluída em 1837 e Daguerre começa desde logo a dar-lhe uso, mas só dois anos mais tarde é que o Daguerreótipo seria conhecido pelo grande público.
É, então, em 1839 que esta invenção passa a fazer parte do mundo, deixando a casa de um inventor. Sabe-se que o objecto tinha sido já revelado a 6 de Janeiro de 1839 pela Academia Francesa de Ciências no jornal Gazette de France. Mas é alguns meses mais tarde, mais precisamente a 19 de Agosto, que o cientista e político François Arago (1786-1853) anuncia, numa reunião do Instituto de França, que o Governo Francês adquiriu a invenção do Daguerreótipo, declarando-o como um presente para todo o mundo.
Daguerre aceitou ceder os direitos da invenção cunhada em seu nome em troca de uma pensão vitalícia para ele e para o filho de Niépce. Depois da divulgação ao público e do prémio vitalício que recebeu, pouco mais se soube do inventor.

Composição de um Daguerreótipo. Fonte: PhotoHistory.

Jean Baptiste Louis Gros, Ponte e Barcos no Rio Tamisa, daguerreótipo, 1851. Fonte: AllArt.

Thomas Easterly, Rio Winooski, 1845-47. Fonte: VTDigger.
O Daguerreótipo foi o primeiro objecto de processo fotográfico a ser comercializado junto do grande público e por isso a procura foi enorme, sendo necessária uma produção em massa. É aqui que entra Alphonse Giroux (1776-1848) que, juntamente com Daguerre e após receber uma licença para tal, iria desenvolver um modelo melhorado para ser vendido ao público.
Composto por duas caixas de madeiras diferentes, esta nova versão era um modelo robusto e pesado, mas que tinha a facilidade de ser produzido em série, tal como era pretendido. Com todos os seus elementos, o peso desta máquina chegava aos 50 kgs. Para além de pesada, era também cara, sendo que Daguerre fazia questão de vender um pacote completo com a máquina, uma caixa de iodo para sensibilizar, uma caixa de mercúrio para a revelação, um queimador para aquecer o mercúrio, objectos para segurar as placas, entre outros. Tudo isto por 400 francos que, para muita gente, era equivalente ao rendimento anual.

Theodore Maurisset, La Daguerreotypomanie, litografia, 1839. Fonte: AllArt.

Daguerreótipo. Fonte: PhotoAlbumUniversal.
Tecnicamente, o Daguerreótipo consistia em fixar uma imagem na tal placa de cobre revestida com prata, expondo essa placa a cristais de iodo. Este método produz um tom contínuo e que, ao mesmo tempo, era capaz de chegar a resultados de alto-contraste graças ao uso da luz reflectida.
Embora este processo tenha sido substituído pela Fototipia (processo de impressão com tinta forte em meio de gelatina bicromada e exposta ao sol) até eventualmente chegarmos às câmaras dos dias de hoje, o Daguerreótipo foi utilizado durante quase vinte anos por todo o mundo. Para além das paisagens, arquitectura e datas comemorativas, também várias pessoas, anónimas e famosas, foram retratadas com recurso a esta invenção, incluindo o próprio Daguerre.
Boulevar du Temple é a primeira fotografia com pessoas a ser gerada por este processo, sendo também a primeira fotografia com pessoas da História. Criada com recurso a longa exposição, não se detectam os elementos que apareciam por pouco tempo, como os carros. Apenas ficam aqueles que não se movem, como as casas, as árvores e outros elementos da rua, e, por sorte, um engraxador e o seu cliente que se mantiveram tempo suficiente no mesmo local para serem também personagens desta imagem e a tornarem algo único.

Daguerreótipo de D. Pedro II, 1855. Fonte: Epics.

Nicholas H. Shepherd, Daguerreótipo de Edgar Allen Poe. Fonte: Epics.

Louis Daguerre, Boulevard du Temple, 1838. Fonte: Wikipedia.
Sendo uma prenda que o Governo Francês deu ao mundo, não faltou muito até que começassem a surgir estúdios de Daguerreótipo por todo o lado. Com a abertura destes espaços, tornou-se grande a procura para a realização de retratos de família. Estes podiam tornar-se um desafio, principalmente para os mais novos, pois o tempo de exposição andava à volta dos cinco minutos, obrigando toda a gente a permanecer o mais imóvel possível durante esse tempo. Ainda assim, era um tempo de espera mais aceitável do que aquele que seria necessário para o primeiro modelo produzido por Niépce, o qual pedia uma exposição de oito horas.
A título de curiosidade, sabe-se que há ainda alguns modelos em circulação, sendo que um exemplar em excelentes condições foi vendido, em 2010, por 732 mil euros.

Daguerreótipo dos Hutchinson Family Singers, 1845. Fonte: MediaStoreHouse.

Daguerreótipo pintado à mão, 1855. Fonte: OhioMemory.
O Daguerreótipo, mesmo sofrendo várias alterações com o passar dos anos, só viria a ficar completamente de lado com a invenção do rolo de filme, em 1884, por George Eastman (1854-1932). Quatro anos depois era fundada a empresa Eastman Kodak Company, empresa essa que se tornaria um império capaz de mudar a forma como registamos e guardamos memórias, mas que, infelizmente, não sobreviveria à revolução digital, declarando falência em 2012.
Embora existissem já as camaras obscuras, as primeiras câmaras portáteis a aparecer, este é o primeiro sistema de captação de imagem permanente, aprimorado e, muito importante, oficializado e comercializado junto do grande público, estando acessível a muito mais pessoas. Desta forma, o Daguerreótipo é marcado como o início do percurso que levou até à Fotografia como hoje a conhecemos.