Ainda com as salas de exposição de longa duração encerradas, o Museu Nacional de Soares dos Reis continua a aposta nas mostras temporárias. Continua também a trazer ao público a conciliação entre Arte e Medicina, tal como fez com a exposição Ciclo da Vida – Outros Lugares, apresentada no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS), entretanto já terminada.
Neste caso, Depositorium 2, que dá continuidade ao projecto iniciado já em 2021 com Depositorium 1, volta às reservas do Museu portuense e apresenta o tema ligado à saúde com recurso a obras que normalmente não estão à disposição do público.

Esquerda: Sousa Pinto, O Filho de Agar no Deserto ou Ismael no Deserto, óleo sobre tela, c. 1885.
Direita: Artur Loureiro, Convalescente. Retrato de Francisco Loureiro, irmão de Artur Loureiro, óleo sobre tela, 1902.
São estreitos os laços que unem este mundo profissional da saúde ao dos museus: ambos se assumem como guardiões, uns do património humano, do seu corpo e da sua mente, e outros do património cultural, material e imaterial.
– António Ponte, in Visão
Para esta segunda mostra de peças das reservas, o Museu Nacional de Soares dos Reis expõe obras escolhidas por António de Sousa Pereira (Reitor da Universidade do Porto), Henrique Cyrne Carvalho (Director do ICBAS-UP), Altamiro Pereira (Director da Faculdade de Medicina-UP) e por Miguel Pinto (Director da Faculdade de Medicina Dentária-UP), reforçando assim uma parceria que vem crescendo nos últimos meses e que teve início com a exposição acima mencionada. A escolha das peças partiu de uma pré-selecção feita pelo pessoal do Museu, selecção essa sobre a qual se debruçaram, então, os directores das instituições. A intenção era a de optar por obras que, de alguma forma, relacionem a Arte com a Medicina pelo lado científico, mas também pelo lado da cura, da crença, do místico e do misticismo.
Assim sendo, a exposição está organizada por núcleos de escolha de cada Director/Reitor e não num desenrolar do que é a vida, não havendo essa narrativa de história do início ao fim. Serve como pretexto para exibir estas obras ao mesmo tempo que cria uma nova leitura da colecção que mostra como a Arte pode ser apresentada com esta ligação à Medicina, apresentando-se em duas narrativas: a do artista que a criou, tendo por base o motivo para o fazer; mas também a da pessoa que a escolheu para integrar esta mostra. Dois fios condutores distintos que conseguem ser fruídos em separado, mas também em conjunto.

António Soares dos Reis, Desenho de Anatomia: Estudo de Osteologia, grafite sobre papel, não datado.

Atribuído ao atelier de Domingos Pereira de Carvalho, Um Cirurgião, óleo sobre tela, século XVII-XVIII.
Peças que possam mostrar uma forma de pensar e estar no mundo ligados à causa médica.
-António de Sousa Pereira, Reitor da Universidade do Porto
Com recurso a desenhos, pintura, cerâmica, escultura e até obras lapidárias, esta exposição permite-nos deambular entre a juventude e a velhice, entre a saúde, a doença e também a morte. Obras que nos mostram desde o nosso esqueleto, horas de cirurgia e até o aspecto sereno com que, por exemplo, António Soares dos Reis ficou na sua máscara funerária. Aliada a essa peça, a estela funerária, (peça mais antiga exposta) apresenta-se como o ponto final da vida.
Faz-se aqui uma reflexão sobre Arte e Medicina, dois elementos da vida e da sociedade que estão historicamente interligados. Não havendo necessariamente um foco em obras de cariz explicitamente científico, esse lado está, ainda assim, presente nelas todas, pois a vida está intimamente associada à Ciência, com todas as mudanças, desenvolvimentos, descobertas que fazem parte do nascer, do crescer e do morrer.
Por entre essas peças e representações, há ainda espaço para obras de teor religioso, reforçando essa aliança entre a Vida e a Ciência que existe e que a Arte sempre soube mostrar.
Não esqueçamos que, até à invenção da Fotografia, a única forma de representar todos os conceitos médicos, imagens do interior e do exterior do corpo, medicamentos e operações (aqui com A Lição de Anatomia do Dr. Tulp, de Rembrandt, em mente, por exemplo) era com recurso à pintura e ao desenho.


Esquerda: António Alves de Sousa, Avant l’Operation, moldagem em gesso, não datado.
Direita: São Damião, madeira estofada com policromia e douramento, século XVII, Portugal.


Esquerda: José Joaquim Teixeira Lopes, Máscara Mortuária de Soares dos Reis, moldagem em gesso, 1889.
Direita: Estela Funerária, ardósia, século II, recolhida na Serra de Santa Justa, Valongo.
Nunca antes se complementaram tanto, sendo hoje, muitas vezes, a Arte prescrita como uma terapêutica e forma de prevenção da doença.
– António Ponte, in Visão
Depositorium 2 pode ser visitada até Junho, de Terça-Feira a Domingo, das 10h às 18h.
O preço de entrada é de 3€ e inclui as restantes exposições, como Seja Dia ou Seja Noite Pouco Importa.
Imagem de topo: José Malhoa, O Remédio, óleo sobre tela, não datado.